Você, seu filho, irmão, ou sobrinho foi diagnosticado com autismo? Tenho uma ótima notícia: você possui muitos direitos. Entretanto, para exercê-los, é necessário, primeiro, os conhecer. Vamos conhecer o direito dos autistas?
Aqui no Brasil, possuímos uma lei que regulamenta o direito dos autistas. A lei nº 12.764/12 instituiu uma política nacional de proteção dos direitos da pessoa com Transtorno de Aspectro Autista, e garantiu diversos direitos maravilhosos a quem carrega essa condição.
Primeiramente, é bom reforçar que autismo é a condição (não doença), que toda criança, adolescente ou adulto que é diagnosticado com o CID-11, código 6A02, tem.
A Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde
CID-11 é a sigla da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde. Já o código que geralmente vem depois (6A02) se refere ao Transtorno do Aspectro Autista. Esse código pode vir seguido de números de 0 a 5 ou Y/Z.
Em suma, no laudo médico vai constar esse código especificando o tipo de autismo.
Abaixo você consegue verificar o significado de cada código e número, conforme a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde:
6 A02 | Transtorno do Aspectro Autista |
6 A02.0 | Transtorno do Aspectro Autista sem atraso no desenvolvimento intelectual e pouco ou nenhum comprometimento da linguagem funcional |
6 A02.1 | Transtorno do Aspectro Autista com atraso no desenvolvimento intelectual e pouco ou nenhum comprometimento da linguagem funcional |
6 A02.2 | Transtorno do Aspectro Autista sem atraso no desenvolvimento intelectual e com comprometimento da linguagem funcional |
6 A02.3 | Transtorno do Aspectro Autista com atraso no desenvolvimento intelectual e com comprometimento da linguagem funcional |
6 A02.4 | Transtorno do Aspectro Autista com atraso no desenvolvimento intelectual e com ausência de linguagem funcional |
6 A02.Y | Outro Transtorno de Aspectro Autista específico |
6 A02.Z | Outro Transtorno de Aspectro Autista não especificado |
PERAI, MEU CID É 10, E AGORA?
Não se desespere se você foi diagnosticado com CID 10.
Afinal, CID 10 entrou em vigor em 1993, porém, para abranger mudanças na medicina e tecnologias alcançados, a OMS lançou, em 2018, uma alteração do CID 10 para o CID 11.
O novo CID 11 aumentou a lista, e incluiu, além do TEA, transtornos relacionados a uso excessivo de eletrônicos, síndrome do Burntout e transexualidade.
Além disso, foram agrupados neste CID outros transtornos que podem vir a fazer parte do TEA, como o autismo infantil, síndrome de Rett, síndrome de Asperger, transtorno de hipercinesia e transtorno desintegrativo da infância.
Portanto, a mudança veio para melhorar. Se você foi diagnostica com CID 10 no passado, saiba que a classificação foi alterada para CID 11. Marque uma consulta com seu médico para um laudo mais atualizado.
A Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno de Aspectro Autista
Entre as diretrizes que a nossa política nacional de proteção dos direitos da pessoa com Transtorno de Aspectro Autista possui – que você pode ler na íntegra clicando aqui – destaca-se a:
(i) atenção integral às necessidades de saúde, objetivando o diagnóstico precoce e atendimento multiprofissional;
(ii) o estímulo à inserção da pessoa com o aspectro no mercado de trabalho; e o
(iii) incentivo à capacitação de profissionais especializados no atendimento à pessoa com o aspectro.
Interesse citar que foi essencial que a letra da lei trouxesse o atendimento multiprofissional à tona. O tratamento multiprofissional é a realização de diversos tratamentos ao mesmo tempo.
Isso é importante pois a pessoa autista, em especial, as crianças, precisam do acompanhamento de profissionais da saúde de diversas áreas para garantir o seu pleno desenvolvimento e qualidade de vida – esse é um direito das autistas importantíssimo.
O Direito dos Autistas
Além disso, o artigo 3º da lei elencou os direitos que os autistas carregam:
Art. 3º São direitos da pessoa com transtorno do espectro autista:
I – a vida digna, a integridade física e moral, o livre desenvolvimento da personalidade, a segurança e o lazer;
II – a proteção contra qualquer forma de abuso e exploração;
III – o acesso a ações e serviços de saúde, com vistas à atenção integral às suas necessidades de saúde, incluindo:
a) o diagnóstico precoce, ainda que não definitivo;
b) o atendimento multiprofissional;
c) a nutrição adequada e a terapia nutricional;
d) os medicamentos;
e) informações que auxiliem no diagnóstico e no tratamento;
IV – o acesso:
a) à educação e ao ensino profissionalizante;
b) à moradia, inclusive à residência protegida;
c) ao mercado de trabalho;
d) à previdência social e à assistência social.
Como deu para perceber, inegavelmente, a lei caprichou bem no direito à saúde, deixando mais uma vez claro a necessidade do atendimento multiprofissional, a importância do diagnóstico precoce, nutrição e medicamentos.
O acesso à educação, residência, mercado de trabalho e assistência social também se incluem aí. Por isso, caso seu filho esteja sofrendo algum tipo de represália ou impedimento ao frequentar a escola, não deixe de conversar com um advogado!
É necessário lembrar que, independente de matrícula na rede pública ou privada, a escola não pode negar o autista, e não existe número máximo de vagas para “alunos de inclusão”.
Sobre a assistência social, já fizemos um post específico sobre isso aqui no blog. Para saber se você, seu filho ou qualquer outra pessoa com TEA tem possibilidade de receber o benefício, clique aqui.
Deseja receber ajuda de um advogado para esse assunto?
Atendemos todo o Brasil! Conte com ajuda de advogados especializados para te auxiliar nesse assunto, preencha o formulário que em breve iremos entrar em contato com você.
CIPTEA – Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno de Aspectro Autista.
Apesar de a política nacional ter sido publicada em 2012, posteriormente, no ano de 2020 uma nova lei adicionou, no art. 3º-A, a CIPTEA – Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno de Aspectro Autista.
A expedição da carteira possibilita a garantia a atenção integral, pronto atendimento e prioridade em atendimento e serviços públicos, em especial, nas áreas de saúde, educação e assistência social.
A CIPTEA é uma grande conquista, pois as maioridades das pessoas diagnosticadas com a TEA possuem “aparência normal”. Quem lida com essa condição sabe o quanto é comum comentários como: “mas não parece que ele tem autismo” e “ela parece normal”.
Com a CIPTEA, é rápido e fácil comprovar o diagnóstico, e garantir o tratamento diferenciado necessário. Além disso, ela possui validade de 5 anos.
Entretanto, em que pese a ideia seja fantástica, por se tratar de lei relativamente nova (2020), alguns estados da federação ainda não se adaptaram para sua expedição. Se acaso você mora em Santa Catarina, você pode clicar aqui para conseguir mais informações sobre como fazer a carteira.
Os documentos necessários para criar a CIPTEA podem variar de estado para estado, mas, em geral, para emitir a carteira, você vai precisar de:
- Laudo médico com indicação do código CID;
- Carteira de identidade e CPF do autista e de dois responsáveis legais
- Comprovante de residência do autista
- Tipo sanguíneo do autista
- Foto 3×4 do autista
Caso você seja imigrante detentor de visto temporário ou autorização de residência, residente fronteiriço ou solicitante de refúgio, vai ser necessário também a apresentação de Cédula de Identidade de Estrangeiro (CIE), Carteira de Registro Nacional Migratório (CRNM) ou Documento Provisório de Registro Nacional Migratório (DPRNM),
Planos de Saúde e Autismo
A política nacional de proteção dos direitos da pessoa com Transtorno de Aspectro Autista garantiu, em art. 5º a impossibilidade dos planos de saúde privados negarem a participação de autistas.
Isso ocorre, pois, a pessoa autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais (art. 1º, § 2º, Lei nº 12.764/12).
Nesse sentido, o art. 14 da Lei 9.656/98, que dispõe sobre planos e seguros privados, informa que ninguém será impedido de participar de planos privados de assistência à saúde em razão de idade ou condição de pessoa portadora de deficiência.
Entretanto, apesar do autismo não se tratar de uma doença, e sim uma condição, muitos planos de saúde ainda negam a entrada de autistas ou informam a incapacidade de cobrir tratamentos por se tratar de “doença pré-existente”.
Além dessa justificativa, outra muito comum para os plano negarem o tratamento é a de que não estão inclusos no famoso Rol da ANS – Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar. Este rol estabelece os procedimentos e eventos com cobertura assistencial obrigatória a ser cumprido pelos planos de saúde privados.
O Rol da ANS
Em princípio, o rol da ANS era taxativo. Isso significava que os planos de saúde só estariam obrigados por força jurídica a cobrir apenas e tão somente os procedimentos listados lá. Portanto, se não estivesse no rol – uma pena.
Entretanto, após diversas pessoas entrarem com ações judiciais para garantir a cobertura do plano em situações difíceis, o Judiciário foi relativizando o rol, criando exceções em alguns julgamentos. Posteriormente, isso levou a discussão para o Senado, que aprovou, em 29/08/2022, um projeto de lei que derrubava o rol.
Esse projeto já se encontra em vigor. Você pode ler essa decisão na íntegra clicando aqui.
Portanto, atualmente, os planos de saúde podem sim ser obrigados a cobrir tratamentos que não estejam listados no rol – esse também é um direito dos autistas.
Além disso, em 23/06/2022, também este ano, antes da derrubada do rol taxativo, a ANS já havia aprovado uma normativa ampliando as regras de cobertura para pessoas com o TEA, ou seja, ampliando o direito dos autistas, incluindo sessões ilimitadas de fonoaudiólogos, psicólogos, terapeutas ocupacionais e fisioterapeutas no rol.
O Autista e a Pessoa com Deficiência
A pessoa autista é considerada pessoa com deficiência para todos os efeitos legais (art. 1º, § 2º, Lei nº 12.764/12).
Isso significa que o autista possui acesso a todos os descontos, isenções e direitos que a pessoa com deficiência tem acesso. Portanto, o direito das pessoas com deficiências também é direito dos autistas.
Em breve, faremos um post novo para falar apenas desses direitos 😉
Daiane Tomé Furlanetto | Advogada